quarta-feira, 5 de agosto de 2015

O sonho e a frustração: porque desistimos dos antigos

Mercedes Benz 320 SL Gull Wing 1962 restaurada















Não importa qual sua idade; é praticamente impossível se deparar com um deles na rua e não pensar imediatamente ''meu pai (ou qualquer outra pessoa) tinha um desses''. Sim, estamos falando dos queridinhos daqueles que realmente entendem e são apaixonados por carro: os antigos. 

Quer você goste, quer não, o fato, inegável, é que eles jamais passam desapercebidos. Pode até ser uma vítima de 'bullying automotivo', quando chamado de 'pois é...' ou outros apelidos menos delicados, mas que ninguém fica indiferente ahh isso ninguém fica mesmo...rs

Entretanto, aqueles que desenvolvem gosto pelo mundo automobilístico no decorrer dos anos acabam, em algum momento se apaixonando pelos antigos. As vezes por um modelo específico, por uma marca em especial, por um determinado período da história; carros dos anos 20, 30, 60, 70. Seja como for, carro antigo é sinônimo de diversão, história, conversas de final duvidoso e assim por diante, certo? Nem sempre... 

A questão é que entre se apaixonar por esse mundo e fazer parte dele efetivamente, o incauto pseudo-antigomobilista vai penar e muito. Por que? Bem, tudo começa por COMO iniciamos nossa jornada pelo universo antigomobilista. Os mais velhos principalmente, como eu (rsrs), provavelmente tinham em revistas como Oficina Mecânica, Motor 3, Auto & Técnica e outras fontes infalíveis de informação e principalmente de imagens inesquecíveis imortalizadas em fotos de inúmeras matérias com carros 'colecionáveis', Hot Rods, preparados e afins. Aqueles que já nasceram na era da internet tem muito mais poder de informação, pois basta digitar qualquer coisa referente ao tema no Google que a sequencia de imagens nos deixa sem fôlego. 

Até aqui tudo ótimo, o que melhora ainda mais quando temos a oportunidade de conhecer pessoas que possuem um ou mais antigos, quando vamos a encontros, quando conseguimos conversar com pessoas que já estão na brincadeira há tempos. E geralmente é nesse ponto que decidimos ''vou comprar meu carro antigo''. É simples! Tambem queremos ter histórias pra contar. Tambem queremos ouvir elogios e observar os olhares de admiração de outros sonhadores ao olharem para o NOSSO carro. 

E é tambem aí que a maioria acaba se frustrando. Por que? Bem, para tornar mais fácil a compreensão por parte daqueles que ainda não tem seu antigo vou exemplificar. Suponhamos que você seja um apaixonado por Fusca. Sua vida vai ser fácil! Peças por todo lado, em qualquer farmácia ou padaria você encontra, Fusca é sempre baratinho.... Não, amigo, não mesmo. Se você costuma sonhar com os Fuscas que ve nas revistas, ou nos sites da internet, ou mesmo nos encontros, a menos que você tenha, digamos, 15 mil reais, provavelmente seu carro não será como esses. Tudo começa na aquisição do carro. Caso este seja seu sonho e você disponha deste valor, ótimo! Você tem 50% de chance de ter um carro digno dos bons encontros de antigos. Só 50%? SIM! Pois se você nunca teve um antigo a probabilidade de você comprar um lixo a peso de ouro é estratosférica! Não se pode analisar um carro antigo como se analisa um carro usado comum. Mesmo que você seja corajoso o bastante para usar seu Fusca no dia a dia normalmente. Por que corajoso? Bem, ladrões AMAM carros antigos, especialmente em SP, principalmente nas cidades do Grande ABC. Mas o fenômeno ocorre também em outras cidades e estados. É um risco iminente de roubo, pois convenhamos os antigos não são lá tão seguros contra esse tipo de crime. É muito mais fácil arrombar um antigo que um carro popular atual, por exemplo. Outro risco é o de um acidente. Você acha mesmo que se comprar um Fusca de coleção pagando algo em torno de 25 mil e alguem acabar com ele numa batida alguem vai te pagar esse valor? Por experiência própria, NÃO MESMO!

Mas imaginemos que você não tenha todo esse valor. Ou ainda que goste de um modelo mais caro, como um clássico europeu ou um grande nacional da década de 70. Que tal um belo Dodge V8? Bem, se você está pensando nos 15 mil esqueça. Dificilmente se encontra um Dodge com motor (mesmo parado) por esse valor ou menos. E então você pode pensar ''ah, mas eu já vi Dojão por mais 100 mil! É um investimento ótimo! Posso comprar um por 15, restaurar e vender por 90 que já ganho muito dinheiro!''. E mais uma vez... Errado. O raciocínio é simples: o que dita o mercado não são anúncios. É o que efetivamente alguem consegue em mãos. É óbvio que ninguém dirá que vendeu um carro de 50 mil por 50 mil. Dirá que o vendeu por 150, para que ele ''valorize'' mais e ele possa ganhar mais dinheiro no próximo. E então o que acontece? Um Dodge, ou qualquer outro carro antigo, passa a valer, em estado de restauração total, o que deveria valer um carro em situação BEM melhor... 

Quem lida com isso há mais tempo como eu sabe: até meados de 2005 encontrávamos Dodges, Opalas, Mavericks, Fuscas, tudo a preços em torno de 6 a 10 mil. Isso para carros em excelentes condições! Hoje mal se compra um motor V8 por esse preço, que dirá um carro... E estamos falando de 10 anos apenas! Mas nem tudo é má notícia. Houve tempo em que o mercado praticava preços completamente fora da realidade, tempos em que um Maverick pintado com spray custava mais que um Mustang, que um Dodge Dart com motor fumando custava mais que um Camaro e coisas assim. Não que haja comparação mas não precisa ser muito inteligente para saber que um importado sempre foi mais caro que um nacional antigo. Hoje porém já há sinais de que as coisas voltam, devagar, a patamares mais realistas, mas ainda assim com preços elevados. 

Pouco mais de uma semana atrás estive no tradicional encontro de antigos de São Caetano do Sul, SP, realizado no belíssimo Parque Chico Mendes. Ótimo local, carros muito bons, e surpreendentemente preços convidativos! Um senhor vendia um Opala Cupe 74 Gran Luxo, em estado impecável, 6 cilindros, por 30 mil.

Opala Cupe Gran Luxo 4100 1974 
Um outro anunciava um excepcional Comodoro 80 com teto Las Vegas por 22.500 e as ofertas não paravam por aí. Maverick GT V8 por 55 mil, Fusca 68 por 12 mil... Todos (bem) restaurados. Sabe quanto custa uma restauração completa? Te garanto, bem mais que o valor pedido. Mas e quem não tem esse dinheiro? 

Sim, caímos no mesmo problema do início. Aquele que torna a injusta frase ''carro antigo é pra quem tem dinheiro'' verdadeira. Pode ser que um opaleiro consiga um Opala maravilhoso por menos de 20 mil. Mas e quem só tem , digamos, 6 mil dilmas? Vai acabar comprando um carro que vale 2, pelo qual pagará 5, para gastar 30 numa reforma mal feita que o ''profissional'' jura que é restauração e, geralmente depois de anos, vender o carro todo desmontado por 6... 

Não são palavras de um iniciante, acredite. E é por isso que esse mundo fica tão inacessível a gente como eu, talvez como você, leitor ou leitora, que sonha com um antigo mas volta de cada encontro com aquela alegria e satisfação e ao mesmo tempo com aquela sensação de vazio, como quando você namora e vai embora da casa da pessoa amada e não pode levá-la com você. 

Minha opinião? Não desanime. Quer um conselho? É muito melhor andar num carro VELHO (velho sim, não antigo) do que nunca ter tido a experiência. Não tem dinheiro pra um Camaro SS 69? Compre um que caiba no teu bolso! Melhor andar num Chevette de 3 mil! Inicie-se! Venha para esse mundo! Não importa o ''brinquedo'' que você tem. Aprenda a brincar! Até porque a magia não está apenas nos carros, mas sim nas amizades conquistadas, no sabor da conquista, no gostinho de estar a bordo de um pedacinho não de qualquer história, mas da SUA história. Não seja mais um passageiro da vida. Pilote sua história! E se precisar de ajuda... Acredite, seus novos amigos antigomobilistas estarão a sua disposição, a começar por mim ;)